sábado, 25 de janeiro de 2014

Como trocar o pneu furado da bicicleta

Postado no blog Eu Vou de Bike



Imagine que você está pedalando e seu pneu fura no meio do passeio. Que tristeza, não? Infelizmente esta é uma emergência mecânica muito mais comum do que a gente imagina. Dificilmente quem pedala nunca foi vítima do famigerado pneu furado.
Neste tutorial explicaremos como trocar a câmara enchendo-a tanto com a bomba de ar convencional como com a bomba de CO2, simulando o problema tanto na roda dianteira (mais simples), quanto na traseira (normalmente mais complicada, principalmente se sua bicicleta tiver transmissão). No próximo tutorial ensinaremos como fazer um reparo (remendo) na câmara.
Para que você não seja pego de surpresa com um imprevisto deste tipo, o ideal é sair de casa com um kit de reparação, que pode variar um pouco conforme as necessidades e o trajeto a ser percorrido. Se for um passeio rápido pela cidade, o kit é mais simples. Se for uma longa cicloviagem, o ideal é ter um kit mais completo.
Um kit de reparos de pneus é composto por:
- Canivete de ferramentas para bicicleta multifunção, facilmente encontrado nas bikeshops e grandes magazines de esporte*;
- Bomba de ar para bicicleta**;
- Kit de reparo de câmara;
- Câmara de ar reserva;
- Bomba de CO2;
- Adaptador de válvula presta (mais fina, presente nas bicicletas mais especializadas) ou schrader (a mais comum, igual aos automóveis)***;
- espátula para remoção da câmara****.
* Não é necessário para o conserto do pneu. Porém, se for um canivete completo, ele pode conter as espátulas para a remoção da câmara (caso do utilizado em nosso tutorial). Além disto, este é um item indispensável para quaquer emergência mecânica;
** Hoje estes equipamentos são cada vez mais leves e portáteis, facilitando muito o transporte e manuseio;
*** Este adaptador se faz necessário caso sua bicicleta tenha uma válvula do tipo presta, porque as bombas localizadas em postos de gasolina estão preparadas para lidar somente com a válvula do tipo schrader;
**** Apenas se este item não estiver presente em seu canivete. Dê preferência para as espátulas feitas em plástico, pois as metálicas requerem muita habilidade no manuseio para não danificar os aros.


Exemplo de válvula do tipo “schrader”

Exemplo de válvula do tipo “presta”


 
Kit mais completo, capaz de realizar reparo ou substituição da câmara, tendo uma bomba dual, ou seja, funciona tanto como uma bomba convencional como uma bomba de CO2


Kit básico para substituição de câmara

Os kits acima prevêm duas situações: uma troca rápida ou um remendo na câmara. E a decisão sobre qual maneira realizar o conserto pode depender de vários fatores. Se seu pneu furou em um lugar perigoso e não há local seguro para o reparo, por exemplo, o ideal é optar pela troca da câmara, enchendo-a com uma bomba de CO2. Em uma competição, a opção é a mesma.
Mas se o seu pneu furar em um local seguro e você não tiver pressa para executar o reparo (o famoso “remendo”) na câmara, esta pode ser a opção mais em conta porque você vai continuar usando a mesma câmara. Porém, o ideal é sempre que possível trocar a câmara, mesmo que posteriormente, uma vez que a área remendada quase sempre terá mais facilidade de se romper futuramente.
O ideal também é que sua bicicleta tenha as blocagens das rodas do tipo “quick release” (soltagem rápida), que custam barato e facilitam na hora de sacar a roda. O “quick release” ajuda também se você transporta sua bicicleta dentro de um automóvel e precisa tirar a roda dianteira para fechar o porta-malas. Se sua bicicleta não possui este sistema de blocagens, é um investimento que vale muito a pena!


Sistema de blocagem “quick release”

Trocando a câmara da bicicleta

1-) Se sua bicicleta tiver marchas, é necessário trocá-las para a seguinte posição (principalmente se o furo ocorreu na roda traseira):
- coroa dianteira menor (marcha mais leve, menor)
- catraca traseira menor (marcha mais pesada, maior)
Fazemos isto para retirar a tensão sobre a corrente da bicicleta, o que facilita o manuseio da roda traseira.

2-) Depois devemos desarmar o freio da roda envolvida.


Neste tutorial, utilizamos um sistema de freios do tipo “v-brake”, mais comum de se encontrar. Se sua bicicleta tiver freios do tipo cantilever, o desarme é muito parecido. Se for freio a disco, o desarme varia conforme o sistema: mecânico (mais simples e comum), ou hidráulico (mais complicado de manusear). Se este for seu caso, deixe seus comentários no post que responderemos posteriormente.

3-) Sacar a roda, soltando a blocagem, tomando cuidado para não desalinhá-la. Para não desalinhar a roda, basta observar que o pneu deve estar posicionado bem no centro do garfo durante a operação posterior de travamento do “quick release” (ou blocagem). Ao montar novamente a roda, gire-a observando se esta flui normalmente. Se ela estiver “pegando no freio”, solte-a e repita a operação novamente, até não encontrar mais problemas.


4-) Desmontar o pneu com as espátulas apropriadas, conforme a sequência abaixo:


5-) Retirar a câmara afetada, examinando-a para ver onde ocorreu o furo. Examine também o pneu, interna e externamente. Tal exame é importantíssimo, na medida em que o agente causador do furo (ex.: pedaços de vidro) ainda pode estar alojado no pneu e certamente vai furar a novamente a câmara. Inicie a retirada da câmara pela válvula, conforme indicado abaixo:


6-) Pegue a câmara nova e encha-a ligeiramente, para que ela “molde” melhor no pneu ao ser colocada, evitando assim que a mesma fique dobrada no interior do pneu, o que causará a deformação do mesmo.


7-) Posicione a câmara no pneu conforme a foto abaixo:


8-) Inicie a inserção da câmara no interior do pneu, começando pela válvula:


9-) Você pode usar as espátulas para inserir a câmara


10-) Remonte o pneu no aro


11-) Encha o pneu, procurando respeitar a medida impressa na lateral do mesmo, conforme explicado neste post


12-) Finalize remontando a roda em sua posição original, lembrando de armar novamente o freio.

Veja no vídeo como a troca de câmara é feita:

Desmontando a roda traseira

1-) Se sua bicicleta tiver marchas, troque-as para a seguinte posição:
- coroa dianteira menor (marcha mais leve, menor)
- catraca traseira menor (marcha mais pesada, maior)


2-) Desarme o freio traseiro, solte a blocagem e “empurre” a roda para frente e para baixo, sacando-a do quadro conforme a sequência abaixo:


3-) Realize os procedimentos explicados sobre a troca de câmara acima
4-) Coloque a roda novamente, inserindo a corrente inicialmente na catraca menor, posicionando-a no quadro, conforme as fotos abaixo (aqui vale a mesma dica para as blocagens comentada acima no post, com relação a centralização da roda)


É isto! Esperamos que vocês tenham que executar estes procedimentos o mínimo possível! Na próxima semana, ensinaremos como reparar uma câmara.
Bicicleta usada no tutorial: Houston Mercury HT
Oficina: Biketime
Mecânico: José Maria

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Ciclofarsas e ciclorriscos do Brasil

Revista Bicicleta por André Geraldo Soares 17/06/2013

Ciclofarsas e ciclorriscos do Brasil
Foto: Pi-Lens
Assim como ninguém chama uma pinguela de ponte nem uma viela de avenida, não podemos permitir que se difundam denominações erradas a respeito das vias ciclísticas, principalmente porque algumas vezes tais denominações são propositalmente enganosas. Por maior esforço que façam os prefeitos nos seus discursos, por ignorância ou má-fé, um risquinho pintado na beira do asfalto não é uma ciclovia.
O mais duro ao ouvir uma impropriedade dessas é saber que a via ciclística levou um bom tempo sendo pensada, projetada, contratada e executada, tramitando por vários departamentos técnicos da administração pública e de empresas de engenharia. Passou pelas mãos de técnicos com conhecimento de sistema viário, de legislação e de operacionalização de trânsito e mesmo assim, quando pronta, lá vai o prefeito inaugurar, ou apenas seu departamento de comunicação divulgar uma deformidade como se fosse uma maravilha da segurança e do respeito à dignidade do ciclista.
O Código de Trânsito Brasileiro é bastante claro: ciclovia é uma “pista própria destinada à circulação de ciclos, separada fisicamente do tráfego comum” (por mureta, canteiro ou similar), e ciclofaixa é “parte da pista de rolamento destinada à circulação exclusiva de ciclos, delimitada por sinalização específica” (com pintura, tachões reflexivos etc). Infelizmente, o detalhamento ainda não está regulamentado, mas as orientações do Ministério das Cidades são claras (ilustradas por tabelas) e respaldadas por técnicos especialistas: ciclofaixas podem ser instaladas apenas em vias com pequeno fluxo de veículos motorizados (unidades/hora) e com baixa velocidade máxima permitida (km/hora); nas vias públicas onde há grande fluxo de veículos motorizados circulando em velocidades letais, é necessária a instalação de ciclovias.
Portanto, mesmo que seja tecnicamente boa, uma ciclofaixa converte-se em uma ciclofarsa se instalada em uma avenida de tráfego denso e rápido. É uma fraude para os ciclistas que dela farão uso, pois estes não contarão com a segurança necessária para pedalar despreocupadamente; é um logro para a sociedade em geral, que, por desconhecimento, ficará com a impressão de que a nova estrutura é uma grande contribuição para a cidade.
Além disso, tanto ciclovias como ciclofaixas precisam ter largura suficiente, sinalização clara e abundante, pavimento plano, iluminação e drenagem adequadas e tratamento especial nos cruzamentos com as vias de motorizados. Está tudo lá no “Caderno de Referência para elaboração de Plano de Mobilidade por Bicicleta nas Cidades”.
Uma via ciclística exclusiva deve ser segura para todas as pessoas e não apenas para jovens hábeis e destemidos. Uma ciclovia ou ciclofaixa estreita, mal sinalizada e com obstáculos (postes, lixeiras, bueiros etc.) torna-se um ciclorrisco, uma verdadeira armadilha, principalmente para crianças, idosos e pessoas com pouca experiência. Pesquisas comprovam que mais de 50% das pessoas estariam dispostas a usar a bicicleta como meio de transporte se houvesse segurança (o que é chamado de “demanda reprimida”), mas muitas ciclovias e ciclofaixas são tão mal feitas que não conseguem ser atraentes para elas.
As vias públicas explicitamente compartilhadas com ciclistas (apesar de que, legalmente, todas as vias públicas o são), tal como as recentes ciclorrotas de São Paulo, também precisam garantir segurança para os pedaladores, mas desta vez com a redução da velocidade dos motorizados, farta sinalização vertical e horizontal, eliminação de faixas de estacionamento e constante fiscalização dos agentes de trânsito. Não se pode recomendar aos ciclistas que sigam determinada rota se na prática ela é tão hostil a eles quanto as demais vias públicas.
Outro problema crônico nas administrações públicas municipais, e que não incentiva o cidadão a comprar uma bicicleta, é a ausência de uma política cicloviária autêntica, o que resulta na construção de vias ciclísticas frequentemente curtas, instaladas em locais menos prioritários e, mais frequentemente ainda, isoladas e desconectadas. Sem responsáveis nomeados, sem planejamento de expansão a médio e longo prazo, sem estruturas adicionais de integração intermodal e sem a participação da sociedade, os ciclistas não têm como confiar que as ciclofaixas ou ciclovias de má qualidade sejam aprimoradas futuramente.
Portanto, o debate sobre a nomenclatura cicloviária não meramente de caráter conceitual e abstrato, é um debate fundamentado na realidade da malha cicloviária das cidades brasileiras, que está longe de atingir uma qualidade média. Chamar a atenção sobre o uso inadequado da terminologia não é uma questão de purismo linguístico, não é uma perseguição aos escorregões semânticos dos jornais ao reproduzirem as declarações dos secretários de obras, é uma questão de esclarecimento social e de precaução contra os embustes – especialmente em período eleitoral! É uma questão de não comprar gato por lebre, sobretudo quando quem paga a conta é o cidadão, seja com seus impostos, seja com seus ossos.

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Departamentos Estatais de Armadilhas para Ciclistas

Revista Bicicleta por André Geraldo Soares 10/12/2013
Departamentos Estatais de Armadilhas para Ciclistas
Foto: Eu vou de bike

As cidades estão repletas de perigos, dificuldades e transtornos para os ciclistas. A omissão abrange todos os setores da administração pública: ruas apertadas e adensadas formam uma infraestrutura hostil aos ciclistas e pedestres, o descuido e a soberba de motoristas e ciclistas são consequência da ausência de programas de educação para o trânsito, e a escalada crescente de violência viária resultam da falta de fiscalização e de punição às infrações.
Deste modo, o poder público assume uma postura de “pedala quem quer”. Não sejamos ingênuos: grosso modo, as prefeituras, os governos estaduais e o federal não desejam ciclistas nas ruas e, por isso, deliberadamente, tratam de não lhes oferecer nenhum agrado. Para a mentalidade dos gestores urbanos, os ciclistas são um problema, e não uma solução para a mobilidade urbana. Assim sendo, no mais das vezes, se negam a cumprir seus deveres constitucionais e, quando sucede qualquer tragédia, se isentam de culpa entregando a responsabilidade à insensatez dos ciclistas ou à imprudência dos motoristas.
Por isso, torrando os impostos que todos nós pagamos, o Estado entrega avenidas, rodovias, trevos e viadutos que não enganam ninguém. São obras de engenharia que declaram bem explicitamente: “ei, ciclistas e pedestres, aqui nós te devoraremos!”.
Mas ao oferecer alguma infraestrutura específica para o uso da bicicleta como meio de transporte, a situação é diferente: o administrador público está, com isso, estimulando as pessoas a pedalar. E se a infraestrutura é inacabada ou mal feita, ela assemelha-se a uma arapuca.
Infraestruturas como ciclovias e ciclofaixas são necessárias - em várias partes da maioria das cidades médias, pelo menos - para dar segurança ao pedalar, mas se elas não possuírem qualidade técnica, tornam-se perigosas.
Isto é particularmente importante quando tratamos com crianças, idosos e pessoas com pouca destreza. Tais concidadãos não se sentem confiantes em disputar uma avenida com carros, motos e caminhões – temor este que seria pleno de fundamentos até para adultos habilidosos. Portanto, uma ciclovia ou ciclofaixa novinha pode ser a deixa que faltava. Mas se a ciclovia carece de sinalização, se é mal interseccionada com o restante da estrutura viária, se possui bueiros rebaixados ou outras falhas, tal ciclovia deixa de cumprir seu objetivo.
E não se trata apenas de segurança, mas também do conforto. Não é incomum encontrarmos vias ciclísticas demasiado estreitas para a demanda de ciclistas (o que também é perigoso), ou que alagam durante as chuvas, ou ainda com o pavimento muito mais ondulado do que o asfalto da avenida paralela. Quanto mais problemas possuem as vias ciclísticas, menos atraentes elas são e maiores são as chances de encontrarmos ciclistas pedalando fora delas e, portanto, se aventurando em meio aos carros.
É bem difícil mesmo concebermos que pessoas com diploma, que fizeram promessas durante a campanha eleitoral ou que fizeram concurso público, todos sujeitos ao controle jurídico, planejem e instalem ardis para prejudicar justamente aquelas pessoas que pagam os seus salários.
Mas como interpretar que uma ciclovia seja implantada contígua a uma movimentada avenida sem que seja instalado um bendito semáforo para lhe incorporar ao trânsito? Como explicar que as ciclofaixas permaneçam inacabadas ou desconectadas entre si? Como devemos entender que as autoridades de trânsito fechem os olhos para os carros estacionados sobre as ciclovias? Como ajuizar que, entra prefeito e sai prefeito, as cidades continuem sem planejamento para a integração das bicicletas ao sistema de mobilidade urbana? Como se conformar com ciclorrotas demarcadas que sequer têm reduzidas a velocidade máxima das vias? O que devemos deduzir quando uma obra qualquer interrompe uma ciclovia, sem alternativas provisórias para seus usuários? Como se conformar com o fato de que, entra ano e sai ano, o nosso país simplesmente não publique regulamentação técnica para a infraestrutura cicloviária?
Temos duas alternativas para explicar isso: ou a incapacidade, ou o desprezo. Ou a falta de inteligência, ou a provocação. Ou o poder público está continuamente errando, ou está constantemente nos apresentando ciladas.
Dá a impressão de existir, na união, estados e municípios, Departamentos para a Construção de Armadilhas para Ciclistas. E só existe uma maneira da administração pública deste e dos futuros mandatos refutar esta interpretação: aplicando políticas públicas profundas, continuadas e sérias. E não para contentar os ciclistas, mas para conferir decência à mobilidade urbana.
Para isso é indispensável criar espaços de debate e deliberação com a sociedade civil, realizar estudos e pesquisas, aplicar recursos financeiros necessários para a construção e manutenção de infraestrutura de qualidade e instituir a integração de todas as áreas da administração pública (Ministérios, Secretarias Estaduais e Municipais etc.) para a conversão da atual cultura de mobilidade urbana, cultura esta que se polariza entre presas e predadores.