Por Gui Marques
Tecnologias
Esqueça
por um momento a miríade de apelos “propagandísticos” de válvula disso
ou plataforma daquilo. Existem basicamente dois tipos de amortecedores
hidráulicos: o damper de orifício e o tipo “shim stack” tambem conhecido
como “cartridge” (de cartucho) entre os “motocrosseiros”.
Ambos
sistemas se baseiam no mesmo princípio. O amortecedor (damper) converte
parte da energia cinética (movimento) da suspensão em calor através da
perda e carga em algum obstáculo. Quem “perde carga” aqui é o fluído de
amortecimento, normalmente óleo. Ar também pode ser usado como fluído de
amortecimento (como nos garfos Noleen e nos amortecedores Cane Creek).
Um problema desta tecnologia é que como estes amortecedores usam também o
ar como mola, ao ser aquecido na função de damper o ar vai expandir e
aumentar a pressão, tornando a suspensão mais progressiva e mudando o
seu comportamento.
O sistema de orifícios é o mais simples. O
óleo é forçado a passar por um ou mais orifícios quando o garfo é
comprimido ou estendido, dissipando a energia do impacto. O sistema
funciona bem, mas imagine você sentado em uma sala de cinema com mais
500 pessoas. A tal sala tem apenas uma pequena porta de saída e de
repente você escuta um estouro...
Ao atingir um obstáculo em alta
velocidade algo parecido ocorre dentro de um garfo com um damper de
orifício. O fluído não consegue escoar com a velocidade suficiente e o
garfo endurece consideravelmente. A reação do amortecimento varia com o
quadrado da velocidade, assim um ímpacto que dobra a velocidade com que o
garfo é comprimido vai ser amortecido por uma força quatro vezes maior.
O resultado prático deste efeito são “pontadas” de endurecimento que o
garfo dá em alta velocidade. Esse sistema funciona bem para resistir ao
fim de curso em impactos grandes e em baixas velocidades (dirt jumping e
urban), mas em altas velocidades (Downhill racing) a performance do
garfo deteriora rapidamente. “Alta velocidade” aqui se refere à
velocidade com que o garfo é comprimido, e não necessariamente à
velocidade da bicicleta. Se você, mesmo pedalando a 15 km/h, atingir um
obstáculo com perfil do tipo “quadrado”, a velocidade de compressão vai
ser alta.
Como você deve estar imaginando, a viscosidade do
fluído de amortecimento também influencia o comportamento do
amortecedor. Sem querer tornar este artigo em uma revisão de física do
2º grau, podemos definir viscosidade como sendo a resistência de algum
material em mudar de forma, devido ao atrito interno entre suas
moléculas pressionadas umas contra as outras. Quanto maior a viscosidade
maior a força necessária para fazer o tal fluído escoar por algum
obstáculo (neste caso o orifício). Por isso um óleo de suspensão mais
“grosso” (mais viscoso) torna a compressão e o retorno da suspensão mais
lentos, enquanto que óleos mais finos tornam a retorno e compressão
mais rápidos.
Devido a maior simplicidade o damper de orifício é
usado como alternativa de menor custo em suspensões hidráulicas, ou em
situações onde performance em alta velocidade é menos importante que a
capacidade de resistir a grandes impactos, como no dirt jumping. Como
exemplo temos o sistema SSV e SSVF que a Marzocchi usa na série Dirt
Jumper, Drop off e Jr. T, e o “hydracoil” HC e HC2 que a Rock Shox usa
na Boxxer Race e em outros garfos como a Judy.
Marzocchi Dirt Jumper |
O sistema “shim
stack” (Figura 1) já é bem mais sofisticado e consiste em um pistão com
aberturas para passagem de óleo cobertas com elementos tipo uma arruela
(daí o nome) empilhados em ambas as direções (no lado do retorno e no
lado da compressão). Quando o amortecedor entra em operação o óleo
flexiona as “arruelas” ao passar pela abertura (Figura 2). Quanto mais
rápido o óleo tentar passar (impacto de alta velocidade), mais ele vai
flexionar as “arruelas” aumentando a abertura e deixando passar mais
óleo. O sistema apresenta funcionamento diferente de acordo com a
situação (retorno de alta velocidade na Figura 2, onde o fluido entra
pela parte inferior do pistão e sai pela parte superior flexionando as
arruelas). Na figura 3 já temos compressão de baixa velocidade, onde o
fluido escoa por um orifício sem força suficiente para flexionar as
arruelas. Na figura 4 a situação é de compressão de alta velocidade, com
o fluido entrando pela parte superior e saindo pela parte inferior.
Tipos de arruelas |
Funcionamento |
Seguindo
a analogia anterior da sala de cinema, agora é como se no lugar de uma
porta fixa, a sala fosse equipada com um sistema onde a abertura da
porta aumentasse mais e mais a medida em que mais pessoas apavoradas se
espremessem junto a ela.
O resultado é um garfo cuja performance
se mantém inalterada seja em altas ou baixas velocidades. O
interessante é que o comportamento da abertura em relação á passagem do
óleo depende do formato e tamanho do shim stack. Isso permite uma ampla
gama de configurações diferentes (tuning) dependendo do efeito desejado.
Característica que você jamais sonharia com um damper de orifícios. Por
exemplo, o shim stack pode ser configurado para oferecer uma maior
resistência inicial ao fluxo de óleo, mas uma vez aberto a resistência
ao fluxo seria menor. Este é o princípio básico por trás dos
amortecedores tipo “plataforma estável” tão populares no mercado atual. A
Romic vem oferecendo um amortecer com resistência ao movimento da
pedalada já há alguns anos.
Exemplos do sistema shim stack são o
HSCV e TST que a Marzocchi usa nos garfos top de linha (All Mountain 1,
Shiver, Marathon S, Super T Pro, Monster T, e as lendárias Z1) o TPC e
TPC+ que a Manitou usa na Dorado, Sherman, nas Skareb top de linha e em
alguns outros, e o SDC que a Fox usa em todos os garfos da linha Float,
Talas e Vanilla.
amortecedores Marzocchi Monster T e Super T |
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